Ver beleza ou interesse histórico onde os outros veem apenas objetos ou papéis sem utilidade ou em desuso. Esta é, talvez, a principal característica de quem, por impulso, começa a juntar peças e objetos. E se, na maioria dos casos, o colecionismo é uma sedução passageira, noutros, do fascínio inicial, evolui-se para uma paixão para a vida inteira. Recolher, cuidar, registar, pelo menos na memória, a história que cada objeto encerra pode tornar-se quase uma obsessão e, por mais estranho que possa parecer, também pode funcionar como verdadeira terapia.
Há quem se dedique a uma temática e lhe dirija toda a sua vocação de colecionador (os filatelistas apenas se interessam por selos, os numismáticos focam-se nas suas coleções de moedas…) e, depois, há pessoas como Armando Terra – um colecionador nato e, podemos dizer, generalista.
Tudo começou com o fascínio por um anúncio publicitário. Os 14 anos de Armando mostravam já a diferença do seu olhar sobre as coisas – viu beleza e interesse histórico onde outros viam apenas algo já sem qualquer utilidade.
“As primeiras peças que comecei a colecionar foram coisas relacionadas com a Coca-Cola, comecei com anúncios em porcelana (ainda tenho o primeiro), depois garrafas, copos, esferográficas e diversas outras coisas.”
Respondendo ao tal impulso, que caracteriza quem se dedica a colecionar, Armando sem saber estava a marcar o seu futuro. Hoje o espaço, por maior que seja, parece sempre pequeno para mostrar todas as coleções – cerca de uma dúzia -, que já fazem parte da sua história de vida. Desde os anúncios vintage, às memórias que preserva de uma loja de ferragens, até às vespas e motorizadas, passando pelos automóveis de outras eras, e por tantos outros mais pequenos objetos que se ligam sempre a momentos ou lembranças, mais ou menos, profundas.
“Gosto da variedade de itens que eu tenho. A condição em que eles se encontram também é muito importante para mim. Tento colecionar peças no melhor estado possível, de modo a garantir que tenho uma boa mostra de itens. Eu sou muito apaixonado pelo colecionismo e cada peça tem um sítio especial no meu coração. Até porque algumas me foram oferecidas, por isso as guardo ainda com mais cuidado e sei a história de cada uma.”
No colecionismo a organização é fundamental, caso contrário, o encanto pode perder-se num mero amontoar de objetos. Armando Terra contou-nos que o que custou mais foi o início – “por tudo em ordem e no seu lugar, demorou cerca de três/quatro meses de intenso trabalho, mas depois… agora a coleção quase que toma conta de si.”
Estar no sítio certo, na hora certa, ter sentido de oportunidade, capacidade para negociar com outros colecionadores e muita dedicação têm ajudado Armando Terra a conseguir juntar tudo o que tem. Por outro lado, a partir de certa altura, “as pessoas já sabem do interesse que temos e telefonam-nos para nos dizer o que têm e as oportunidades de negócio surgem. Por vezes há colecionadores que têm peças em duplicado e entramos num processo de troca.”
A paixão de Armando já contagiou o filho. E sente-se no sorriso a satisfação por saber que a sua dedicação a cada peça, a cada objeto, vai ter continuidade. E essa certeza basta-lhe. Armando Terra nunca pensou em vender a sua coleção de coleções num museu. Tudo o que tem será para o filho cuidar.
“Sabe, eu sei onde comprei cada peça, consigo lembrar-me e ver onde a comprei ou arranjei. Esta coleção tem-me ajudado a manter a minha mente ativa. E sinto mesmo prazer em olhar à minha volta e ver o que tenho. É quase uma terapia. Passo aqui muito tempo, cerca de 10 a 11 horas por dia. O meu filho também está por aqui, ajudamo-nos um ao outro, porque ele também tem muito interesse na coleção. Esta coleção cresceu sem eu nunca pensar em vender, nem penso. O meu plano é passá-la para o meu filho que se mostra muito interessado nela.”
Armando Terra, no entanto, não põe completamente de lado a ideia de um dia permitir que a sua coleção de coleções se mostre não apenas a amigos, mas também ao público em geral num hipotético Museu. No ar ficou um esperançoso “quem sabe?…”.
TEXTO: CATARINA BALÇA
FOTOS: NOAH GANHÃO